Polícia de Yeda Crusius é denunciada por tortura
Por Ayrton Centeno, para o Brasília Confidencial
Sentados sobre formigueiros, espancados, ajoelhados durante horas, com as mãos na nuca e a cabeça abaixada, sob a ameaça de patas de cavalos e a vigilância constante de cães ferozes. Estas formas de tortura foram impostas a cerca de 200 sem terra na desocupação da fazenda Southall, em São Gabriel, região da campanha gaúcha, no dia 21 de agosto de 2009. Um sem terra morreu baleado pela costas.
O autor do tiro fatal e os torturadores pertencem à Brigada Militar do Rio Grande do Sul. Estas denúncias, baseadas em testemunhos das vítimas, constam do relatório produzido pela Ouvidoria Agrária Nacional, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, e a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos enviado, em outubro, ao Ministério Público Estadual (MPE). Até agora, porém, o MPE não denunciou ninguém.
“Está havendo demora (da apresentação de denúncia) no que refere ao crime de tortura”, estranhou o ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva Filho.
“Experimente ficar de joelhos, sem poder se mover durante horas com os cães atiçados contra você ao menor movimento. É uma tortura terrível”, comentou.
Na quinta-feira, através da assessoria do MPE, a promotora Ivana Battaglin, de São Gabriel, responsável pelo encaminhamento ou não da denúncia, informou que “o assunto está sendo examinado”. Para Gercino, não se trata apenas de apontar um soldado – como aconteceu com o autor do homicídio.
“No caso da tortura, é preciso responsabilizar, além dos policiais que cumpriram ordens, o oficial que comandou a operação”, ressalta.
A escalada da violência nas operações da polícia militar gaúcha contra os movimentos sociais agravou-se no governo da tucana Yeda Crusius. Em junho deste ano, o Estado tornou-se notícia internacional pelo tratamento dado à questão social. Antes da tragédia em São Gabriel, o Informe sobre o Estado dos Direitos Humanos no Mundo, editado pela Anistia Internacional, já mencionava o Rio Grande do Sul e o excesso de violência empregado nas desocupações de terras. Às demais denúncias juntou-se a do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH). Nesta semana, a entidade entregou relatório às autoridades locais, indicando o aguçamento da violência e a criminalização dos movimentos sociais.
“Criou-se um aparato parecido com o da época militar para os movimentos sociais”, critica o advogado Leandro Scalabrin, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Além da BM, o próprio MPE tornou-se protagonista nesta ofensiva, exigindo, por exemplo, o fim das escolas itinerantes do MST e pressionando a Justiça pela dissolução dos acampamentos, mesmo aqueles situados em terras públicas, à margem das rodovias.
Neste domingo, completa-se 100 dias do assassinato do sem terra Elton Brum da Silva. Ele foi alvejado – pelas costas e a distância de um metro — por um disparo de espingarda calibre 12 na tumultuada desocupação de 21 de agosto. Aparentemente, a morte não serviu para maiores reflexões no governo e na sua força policial. A BM continua usando munição letal nas desocupações, ao contrário das demais policiais militares estaduais.
“Lá existem foices e facas. Não somos cordeiros para serem imolados. Vamos continuar usando (armas com projéteis de chumbo)”, enfatizou o corregedor–geral da BM, coronel Paulo Rogério Porto.
O tiro que matou Elton partiu da arma do soldado Alexandre Curto dos Santos, do 6° Regimento de Polícia Montada – hoje deslocado para o serviço administrativo no quartel da Brigada Militar na cidade de Bagé. Ele alegou que não teve intenção de matar e que imaginou que sua espingarda não continha munição letal. Seu argumento – repetido pelo corregedor da BM — é de que houve “um acidente” e que pegou a arma de um colega em vez da sua. A Brigada demorou 38 dias para apresentar o atirador, o que levantou a suspeita de que tentava encobrir um oficial. O corregedor garante que o soldado Santos é o único responsável. Ele será julgado por homicídio simples.
Fonte: Brasília Confidencial
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