Nara Leão e a música livre


Por Erick da Silva


Nara Leão foi uma das maiores cantoras da música brasileira. Sua contribuição para a cultura nacional é inegável. Neste ano de 2012 completaram-se 70 anos de seu nascimento, em janeiro de 1942, na cidade de Vitória, Espírito Santo.
Tentar resumir a trajetória de Nara Leão não é fácil e nem tentarei me aventurar por este caminho, mas apenas destacar que ela esteve diretamente envolvida no nascimento da bossa nova, participou na fundação do movimento da “Tropicália”, a partir de 1964, foi uma das artistas com atuação mais engajada na luta contra a ditadura, tendo destaque o espetáculo Opinião, ao lado de João do Vale e Zé Keti, um espetáculo de crítica social à dura repressão imposta pelo regime militar.
Mesmo com toda a sua rica e reconhecida trajetória musical, qualquer pessoa que queira comprar um CD de alguns de seus álbuns de sua discografia de mais de duas dezenas de discos se deparará com uma ingrata surpresa: os discos de Nara Leão não existem. Salvo poucas coletâneas que compilam alguns de seus principais sucessos, as músicas de Nara Leão foram reeditadas em CD em apenas duas caixas (metade em 2002, outra em 2005). Os álbuns de Nara esgotaram nas lojas há algum tempo e nunca mais foram repostos em catálogo. Segundo informações divulgadas pela imprensa, a gravadora Universal, que detém o direito de todos os trabalhos lançados pela cantora entre 1964 e 1989, não tem nenhum plano de lançar os álbuns de Nara.


Os discos de Nara hoje, estão completamente indisponíveis. Só é possível encontrá-los em LPs e CDs vendidos a preço de ouro em sebos ou na internet. Este exemplo demonstra bem os efeitos nefastos para cultura brasileira do papel das gravadoras. Inegavelmente, as grandes gravadoras operam com uma lógica marcadamente voltada para o seu lucro imediato.
Felizmente, a música hoje não depende apenas do formato físico, e a internet venho a democratizar e possibilitar que um amplo conjunto de pessoas possam apreciar as músicas da Narinha. Num primeiro momento esta foi uma iniciativa de fãs que disponibilizavam na rede os seus discos e músicas da Nara Leão, sem fins lucrativos e a margem das gravadoras, democratizando o acesso as canções para um sem número de fãs e pessoas que passaram a conhecer a cantora a partir do acesso as suas músicas. Infelizmente, salvo raras e honrosas exceções, suas músicas não costumam figurar nas programações das rádios comerciais ou na TV. Se alguns julgam a internet como a “grande vilã” dos músicos (por facilitar a “pirataria”), este caso prova justamente o oposto. Se não fosse a internet, o talento e a obra de Nara Leão estaria restrita a apenas alguns poucos.
"Em 19 de janeiro de 2012, minha mãe faria 70 anos. E esse é o meu presente: compartilhar sua obra para que todos possam se deliciar, ouvir e pesquisar à vontade."
A frase foi publicada por Isabel Diegues, filha mais velha de Nara Leão , em sua página no Facebook. O presente de Isabel é o www.naraleao.com.br, site onde está disponível toda a discografia da cantora. Isabel promoveu a criação de um site dedicado a sua mãe, sem contar com nenhum apoio público ou da gravadora, onde está disponível fotos, documentos, biografia e todos os discos lançados por Nara.
A única música que ficou de fora foi “E que tudo mais vai pro inferno”, gravada por Nara em 1978 em um disco dedicado ao repertório de Roberto e Erasmo Carlos. Roberto, a partir da década de 1980, passou a rejeitar a canção, sucesso dele na Jovem Guarda, parou de cantá-la e decidiu não autorizar mais gravações e reedições da música. Nesse caso vale recorrer à “busca informal” e encontrar o arquivo na internet para conhecer a versão de Nara para a “música maldita”.
Através do site, pode-se escutar sua bela discografia (ainda que não de para baixar) e apreciar seu talento e conhecer um pouco mais desta magnifica cantora. Em vida Nara Leão foi uma figura central no desenvolvimento da nova música brasileira que emergiu nos idos dos anos 1960. Hoje, postumamente, ela pode de alguma maneira simbolizar os novos rumos que a música brasileira necessariamente terá que percorrer. Em rede, com livre acesso para que qualquer pessoa possa ter acesso a música.
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