Como as revoluções acontecem: padrões do Irã ao Egito
Desde a metade final do século XX e neste inicio de século XXI temos visto, a despeito de alguns que acreditavam que a "história tinha acabado", uma série de revoltas populares de massas que, em alguns casos, culminaram em processos revolucionários. Evidente que uma grande gama de fatores que as fizeram eclodir, bem como uma diversidade ainda maior se observarmos os contornos políticos que as impulsionaram, bem como quanto a seus desfechos.
Desde a Revolução Iraniana de 1979 até os recentes acontecimentos na Tunísia e no Egito, muitos processos de mobilização de massa ocorreram. Não há uma homogeneidade nestes processos, nem tampouco todas se encaixam em uma definição clássica de revolução, no entanto, achei pertinente o esforço do historiador Mark Almond em traçar um paralelo entre estes diferentes processos para buscar uma explicação para a deflagração das revoluções neste período.
Ainda que ele não esgote o tema e tenhamos algumas leituras pontuais divergentes,é uma leitura recomendada para uma analise dos fatores que levam a uma revolução acontecer de fato.
Por Mark Almond
Revoluções podem ser curtas e sangrentas, ou lentas e pacíficas. Cada uma delas tem seu estilo, apesar de haver padrões recorrentes - incluindo alguns que foram demonstrados no Egito.
O revolucionário marxista Leon Trotsky uma vez afirmou que se pobreza fosse a causa de revoluções, haveria revoluções o tempo todo, porque a maior parte das pessoas do mundo é pobre. O que é necessário para transformar o descontentamento de um milhão de pessoas em uma multidão nas ruas é uma fagulha que os eletrize.
Mortes violentas têm sido o catalizador mais comum para radicalizar o descontentamento em revoluções ao longo dos últimos 30 anos. Algumas vezes a fagulha é medonha, como a incineração de centenas de pessoas em um cinema iraniano em 1978, atribuída à polícia secreta do xá Reza Pahlevi.
Outras vezes, o ato desesperado de um manifestante suicida que se auto imola, como o feirante Mohammed Bouazizi, na Tunísia, em dezembro de 2010, inflama o imaginário de um país.
Até rumores de brutalidade, como as alegações de que a polícia secreta comunista havia espancado dois estudantes até a morte em Praga, em novembro de 1989, podem enfurecer um público já totalmente desiludido com o sistema.
Relatos de que Milosevic causou o "desaparecimento" de seu predecessor, Ivan Stambolic, semanas antes das eleições presidenciais na Iugoslávia em 2000, ajudaram a cristalizar a rejeição sérvia a seu regime.
Modelo chinês
A morte - apesar de nesse caso não violenta - também desempenhou um papel na China em abril de 1989, quando estudantes em Pequim tomaram para si a cerimônia de luto organizada pelo governo para o ex-líder comunista Hu Yaobang, ocupando a Praça da Paz Celestial para protestar contra a corrupção do partido e a ditadura.
Mas apesar de a crise chinesa ter estabelecido um modelo de como realizar protestos e ocupar praças simbólicas no centro de cidades, também se tornou o fracasso mais óbvio do "Poder do Povo".
Ao contrário de outros ditadores mais velhos, Deng Xiaoping mostrou energia e habilidade na resposta aos manifestantes. Seu regime melhorou a vida de um bilhão de chineses. Estes foram os soldados enviados para atirar nas multidões.
Manifestantes contrários à "reeleição" de Suharto na Indonésia em março de 1998 culminaram na morte a tiros de quatro estudantes em maio, que detonaram uma série de manifestações e mais violência, até que mil morreram.
Trinta anos antes Suharto poderia ter matado centenas de milhares com impunidade. Mas a corrupção e a crise econômica asiática tinham implodido o apoio a seu regime. Após 32 anos no poder, sua família e seus aliados tinham enriquecido demais, enquanto muitos de seus ex-simpatizantes estavam empobrecendo - uma pobreza que compartilhavam com pessoas comuns.
O que derruba um regime é quando seus integrantes se voltam contra ele. Enquanto a polícia, o Exército e autoridades de alto escalam pensarem que têm mais a perder com uma revolução do que com a defesa de um regime, mesmo protestos em massa podem ser desafiados e esmagados. Lembrem-se da Praça da Paz Celestial.
Mas se integrantes do regime e homens em armas começam a questionar a razão de se apoiar um regime - ou puderem ser subornados - então o poder implode rapidamente.
O presidente Ben Ali da Tunísia decidiu fugir quando seus generais lhe disseram que não atirariam nas multidões. Na Romênia, em dezembro de 1989, Ceausescu viveu para ver o general em quem ele confiava para reprimir os manifestantes tornar-se juiz-chefe de seu julgamento, no dia de Natal.
A pressão externa também desempenha um papel na mudança de um regime. Em 1989, a recusa do líder soviético Mikhail Gorbachov em usar o Exército Vermelho para apoiar regimes comunistas do Leste da Europa, que enfrentavam protestos nas ruas, fez com que generais locais entendessem que a força não era uma opção.
Os EUA repetidamente pressionaram seus aliados autoritários a fazerem concessões e então, quando eles começavam a tropeçar no poder, a renunciar.
Esclerose
A longevidade de um regime e particularmente a idade de um governante pode resultar em uma incapacidade fatal de reagir rapidamente aos eventos.
Do xá do Irã, que sofria de câncer, ao doente Honecker na Alemanha Oriental a Suharto na Indonésia, décadas de poder criaram uma esclerose política que tornou manobras políticas sutis impossíveis. Como o Egito nos lembra, revoluções são feitas pelos jovens.
Saídas graciosas são raras em revoluções, mas a oferta de uma aposentadoria segura pode acelerar e tornar uma mudança mais tranquila.
Em 2003, Shevardnadze foi acusado por muitos na Geórgia de ser um "Ceausescu", mas foi abandonado em sua vila, quando renunciou. Os generais de Suharto garantiram que ele pudesse se aposentar para morrer em paz uma década depois - mas seu filho "Tommy" foi preso.
Quase sempre há uma vontade do povo de punir líderes derrotados. Seus sucessores também acreditam que voltar-se contra um ex-líder pode ser uma distração de problemas econômicos e sociais, que não desaparecem com a mudança de regime.
* O historiador Mark Almond é autor de Uprising - Reviravoltas Políticas que Mudaram o Mundo e professor de Relações Internacionais da Universidade de Bilkent, em Ancara.
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Postado por
ERick
em
2/18/2011
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