Entrevista com Veríssimo: “Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data”


Por Ayrton Centeno

Como Luis Fernando Veríssimo, 73 anos, arruma tempo para tanto trabalho não se sabe. O que se sabe é que são mais de 70 livros. E sem contar as antologias! Há de tudo: romances, novelas, quadrinhos, contos, crônicas, guias turísticos e até poesia. No final de 2009, chegou às livrarias Os Espiões, sua obra mais recente. No entanto, sua tarefa mais pesada não é essa, mas a de alimentar diariamente colunas nos jornais O Globo, O Estado de S. Paulo e Zero Hora. Autor de uma frase cáustica sobre a imprensa – “Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data” – o saxofonista, cronista, romancista, quadrinista, contista e novelista fala aqui sobre mídia, governo Lula, sua situação entre os chamados formadores de opinião, decadência dos diários tradicionais, e-books, elites e eleições.

Brasília Confidencial – Hoje, no Brasil, a mídia enxerga um país totalmente diferente daquele que a maioria da população vê. Enquanto a grande imprensa, pessimista, trabalha sobre uma paleta de escândalos, a população, otimista, toca a sua vida de modo mais tranquilo. Que país o Sr. vê?

Luís Fernando Veríssimo – A imprensa cumpre o seu papel fiscalizador, mas não há duvida que, com algumas exceções, antipatiza com o Lula e com o PT. Acho que os historiadores do futuro terão dificuldade em entender o contraste entre essa quase-unânime reprovação do Lula pela grande imprensa e sua também descomunal aprovação popular. O que vai se desgastar com isto é a idéia da grande imprensa como formadora de opinião.

BC – A grande imprensa enaltece a diversidade de opiniões, mas, curiosamente, os principais jornais do Brasil têm a mesma opinião sobre os mesmos assuntos. Este pensamento único não compromete uma pluralidade de opiniões que a mídia costuma defender quando não está olhando para si própria?

LFV – O irônico é que hoje existem menos alternativas à imprensa “oficial” do que existia nos tempos da censura. Mas as alternativas existem, e o tal pensamento único não é imposto, mas decorre de uma identificação dos grandes grupos jornalísticos do país com alguns princípios, como o da economia de mercado, o governo mínimo, etc.

BC – O senhor defende na sua coluna a reforma agrária e questiona a criminalização dos movimentos sociais. Não se sente muito solitário na mídia tratando desses temas?

LFV – Meus palpites não são muito consequentes. Acho que me toleram como a um parente excêntrico.

BC– Todas as pesquisas indicam a queda da circulação dos grandes diários dentro e fora do Brasil. Com uma longa trajetória no jornalismo, como percebe esta queda persistente, que expressa também o afastamento de uma geração do hábito de ler jornais? E como acompanha o trânsito de boa parte do público para a internet?

LFV – Quem é viciado em jornal e revista como eu só pode lamentar que a era da letrinha impressa esteja chegando ao fim, como anunciam. Mas este é um preconceito como qualquer outro. Mesmo mudando o veículo ainda existirá o texto, e um autor. Vou começar a me preocupar quando o próprio computador começar a escrever.

BC – Atribui-se a um advogado famoso, dono de clientela de altíssimo poder aquisitivo, uma reação irada ao saber que seu cliente endinheirado fora preso: “O que é isso? No Brasil só vão presos os três Ps: preto, puta e pobre!”, reagiu indignado. Estamos no século 21, mas as elites parecem continuar no 19. Acredita que vá ver isto mudar?

LFV – As nossas elites não mudaram muito desde D. João VI. Vamos lhes dar mais um pouco de tempo.

BC – A atual política externa do Brasil, mais independente, colabora de alguma maneira para mudar este comportamento?

LFV – A política externa independente é uma das coisas positivas deste governo. Embora o pragmatismo excessivo possa levar a uma tolerância desnecessária com bandidos, às vezes.

BC – O escritor argentino Jorge Luís Borges dizia que a única notícia realmente nova em toda a sua vida foi a chegada do homem à Lua. O resto já tinha acontecido antes de uma ou outra forma. O que o surpreendeu, além disso? Borges tinha razão?

LFV – O sistema GPS. Finalmente, uma voz vinda do alto para guiar os nossos passos.

BC – Em que trabalha no momento ou pretende trabalhar? De outra parte, o que acha dos e-books?

LFV – Acabei de lançar um romance, chamado Os Espiões. Não tenho outro romance planejado no momento. Devem sair um livro para público juvenil, um de quadrinhos e um sobre futebol este ano, mas não sei bem quando. Quanto aos e-books, só vou aceitar quando tiverem cheiro de livro.

BC – Teremos eleições em 2010 e o governo Lula opera na proposta de um pleito plebiscitário – Nós x Eles – contrapondo os oito anos do PT contra os oito anos do PSDB. Se fosse fazer esta comparação o que diria?

LFV – De certo modo, este governo continuou o outro. E vou votar para que o próximo continue este.

http://www.brasiliaconfidencial.inf.br/?p=11017

5 comentários:

Carlos Eduardo da Maia disse...

A grande mídia é fundamental no Brasil atual. Se não fosse a grande mídia, como o povo ficaria sabendo dos escândalos envolvendo os tesoureiros de campanha, as falcatruas que ocorrem com os políticos de todos os partidos? Por isso a populaçaõ brasileira tem de dizer um rotundo não a essas propostas reacionárias e antidemocráticas que circulam por ai de "controle social da mídia". Controle para quem, cara pálida?

turquinho disse...

Controle social não é censura, óh imbecil, serve para coibir abusos, no que a grande mídia é perita.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Abuso da onde? Por que a grande mídia não pode, por exemplo, dizer ao povo brasileiro que o candidato a tesoureiro da campanha de Dilma está envolvido numa mega fraude de R$ 31 milhões (é dinheiro para caramba) do Bancoop (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo)? Isso, por acaso, é abuso. O governo do PT que é perito em fazer oposição, não consegue suportar nenhuma crítica que se faça ao seu governo.
É sempre assim, dois pesos e duas medidas.

Claudinha disse...

Tá muito bom o blog, Erick!

ERick disse...

Valeu o apoio!
Obrigado!