As escutas e o crime contra a língua portuguesa


A crise que passa o Governo da Yeda, em uma avalanche sem fim de denúncias e escândalos, também tem servido para observarmos o quão rebaixado e permeado de preconceitos se dá as relações da “turma” que está envolvida na trama, o blog RS Urgente (acesse aqui), noticia que, durante o andamento da CPI do Detran, Vaz Netto direciona suas baterias contra o deputado Frederico Antunes, do PP, Ele diz:“Eu vou detonar esses caras, vou plantar uma nota que o Frederico está com as contas dele aí na…ou com aluguéis dele aí na praia pagos por propina de A, de B e de C. Vou começar a foder com este nego filho da puta”.

Acho que dispensa maiores comentários essa frase abertamente racista. Após ler esse absurdo todo, recebi hoje no Twitter, por uma feliz coincidência, um ótimo artigo do nosso sempre genial Luis Fernando Veríssimo, que propõe uma excelente saída para essa turma “O crime contra a língua portuguesa”, acho que seria uma boa saída, visto a morosidade e a falta de justiça que por vezes permeia as decisões do nosso judiciário.
Abaixo, segue o artigo do Veríssimo.
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Um novo gênero invadiu a imprensa brasileira de uns anos para cá: a transcrição de conversas telefônicas em investigações de corrupção
O que mais impressiona não é a quantidade de corruptos, mas a sua falta de articulação verbal.
Ninguém completa uma frase, os erros de concordância se sucedem e a lógica gramatical é constantemente assassinada sem dó.
Fora o fato de que, muitas vezes, recorrem a códigos e linguagem cifrada para driblar o presumido grampo, o que só aumenta a confusão.
– Olha, mandei o embrulho, é, viu? As linguiças.
– As linguiças? (Risos)
– As linguiças pra vocês.
– Hein? – (Risos nervosos) Repartirem aí
– E o pacote é... Vem como? Alô.
– Vai pelo Magrão...
– O Magrão que você diz é o...
– É o Magrão.
– Ah. Sei (risos histéricos)
Não invejo os técnicos da Polícia Federal e do ministério público
São obrigados a decifrar diálogos e achar sentido em falas truncadas, hesitações, barbaridades inconscientes q constituem um diálogo normal.
Porque a verdade é que nós todos falamos assim.
Basta ouvir a gravação de uma conversa nossa ao telefone para nos darmos conta: somos todos culpados, dependendo de como nos interpretarem.
E os poucos que falam corretamente, colocam os pronomes onde devem e fazem sentido são os maiores suspeitos.
Obviamente ensaiaram sua fala para enganar os grampeadores.
Descontado tudo isso o novo gênero não deixa de ter seu encanto. Conheci uma pessoa q folheava rapidamente um livro antes de comprá-lo ou não.
Dizia que não interessava o autor ou o tema do livro, só interessava se tinha bastante diálogo.
Nossos jornais e revistas andam cheios de diálogos realistas que são fascinantes mesmo quando ininteligíveis.
Como o Al Capone, que escapou da punição por todos os seus crimes e foi enquadrado por sonegação de impostos alguns dos nossos corruptos que escaparem da punição por suas falcatruas (o que no Brasil não é difícil), poderiam ser enquadrados, com base nas suas conversas gravadas, por crimes contra o idioma.
Luis Fernando Veríssimo

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