A vitoriosa ocupação da Câmara de Porto Alegre


Por Erick da Silva

Quando dezenas de jovens integrantes do Bloco de Lutas pelo Transporte Público iniciaram a ocupação da Câmara de Vereadores de  Porto Alegre na noite de quarta-feira (10/07), poucos poderiam arriscar com exatidão o desenrolar que o movimento assumiria e seu desfecho.

Tendo o Passe Livre e a transparência nas contas das empresas de transporte público como principais reivindicações, a ocupação rapidamente ganhou força.


O ato de ocupar a Câmara de Porto Alegre foi logo taxado por alguns como "extremista", "vandalismo", ou até mesmo como "ação terrorista", como chegou a afirmar a vereadora Mônica Leal (PP). No entanto, a ocupação tem sua legitimidade constituída a partir do momento que inexistem canais de participação direta, onde a população possa debater e construir as políticas públicas na cidade. A recente rejeição dos vereadores a proposta que tornava pública as planilhas de gastos das empresas de ônibus é um exemplo deste abismo que distancia os vereadores da população. Os vereadores simplesmente ignoraram todos aqueles milhares de jovens que foram as ruas da capital exigir um transporte público de qualidade. Foi este distanciamento que levou os jovens a ocuparem.

Foi esta mesma intransigência e falta de diálogo; simbolizada no presidente da Câmara, vereador Dr. Thiago (PDT); que fez prolongar a ocupação, e que acabou fortalecendo o próprio movimento, que ganhou a solidariedade e o apoio de amplos setores na cidade. A pluralidade que já existia no próprio Bloco de Lutas, viu-se ampliada pela presença de diversas entidades, sindicatos, ambientalistas, artistas e etc, que somaram-se a ocupação e lhe deram mais força.

Desde o primeiro instante da ocupação, os manifestantes mostraram grande capacidade de organização ao se dividir em comissões que garantiram a alimentação para cerca de 200 pessoas, segurança e limpeza. Houve uma comissão que negociou com os vereadores, e outra que fez a comunicação do Bloco nas redes sociais. Durante as mais de 180 horas de ocupação, foram realizados Grupos de Trabalho (GT) que debateram sobre temas como educação, gênero, sexualidade; oficinas de arte, cultura e política; organizou-se um grande seminário que construiu dois projetos de leis, protocolados pelos vereadores.

A postura inicial da ocupação de repúdio aos oligopólios midiáticos (expulsando a RBS da ocupação), demarcou claramente um recorte de esquerda. Esta postura dura e crítica à mídia, ainda que alguns possam criticar julgando como "radical", inegavelmente demonstra uma clareza sobre o papel que a grande mídia exerce na sociedade brasileira. A opção pelo diálogo privilegiado com a mídia alternativa e colaborativa mostra um caminho que muitos na esquerda deveriam refletir.


A ocupação da Câmara de vereadores de Porto Alegre terminou vitoriosa. Prevaleu o diálogo e a negociação, não havendo o uso de força policial para remover os manifestantes, mesmo com todas as manifestações públicas verborrágicas e destemperadas do vereador Dr. Thiago.

A legitimidade do movimento foi reafirmada quando conseguiu derrubar a liminar de reintegração de.posse, em uma decisão que afirmou que o movimento era pacífico, cidadão e sem qualquer depredação ao patrimônio público, conforme vistoriado por dois oficiais de justiça. Na audiência de conciliação, se reconheceu, com isso, que a ocupação não extrapolou os limites do livre exercício da cidadania e apontou que o diálogo é um caminho que precede a judicialização da política, obrigando o vereador Dr. Thiago a voltar a negociar com os manifestantes.

A ocupação conquistou que fossem protocolados na Câmara dois projetos de lei:  um que visa instituir o passe livre no sistema de transporte coletivo por ônibus em Porto Alegre para estudantes e desempregados. O segundo instituindo a abertura e a transparência das contas relativas ao transporte urbano municipal. Durante a audiência, foi entregue diretamente ao Ministério Público uma outra pauta que diz respeito à transparência e controle social no transporte público da cidade.

A luta do Bloco já foi responsável pela revogação do aumento da passagem, em abril e pela diminuição em
junho. A horizontalidade e a capacidade de unidade das juventudes de esquerda são o seu maior trunfo. Agora, após esta ocupação, sai ainda mais fortalecida e credenciada como um espaço de organização das lutas da juventude em Porto Alegre.

O Passe Livre será a próxima conquista, alguém duvida?


Fotos: NINJA
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Um comentário:

Carlos Eduardo da Maia disse...

Falou bem, dezenas, mas todos eles militantes, alguns ccs, do PSTU, PSOL e PT. Politicalha igual, a mesma politicalha que foi criticada pelos movimentos de junho. Esse pessoal, essa minoria participativa ) do bloco de luta não representa o povo de Porto Alegre de mais de um milhão de pessoas. A democracia representativa está em crise, mas o grande problema da democracia participativa ou direta é exatamente esse: o fascismo e a politicalha da minoria participativa.