Estado Laico? Advocacia-Geral garante utilização de símbolos religiosos em instituições públicas



Por Erick da Silva

A atuação da Advocacia-Geral da União (AGU) afastou, na Justiça, um pedido do Ministério Público Federal (MPF) que tentava proibir o uso de símbolos religiosos em instituições públicas da União no Estado de São Paulo.
A ação do MPF tentava garantir que, se o Brasil se declara um estado laico, deveria ter esta laicidade expressada também de forma simbólica, afinal, como afirmar que um estado é laico tendo símbolos de uma única religião sendo expostas nas paredes dos órgãos públicos?
Segundo a tese da AGU, a exposição de crucifixos ou qualquer outro símbolo religioso em prédios públicos não torna o Brasil um Estado clerical, devendo ser respeitada a religiosidade dos indivíduos. Segundo a Procuradoria, a Constituição de 1988, que estabelece a opção pelo Estado laico, também assegura direitos religiosos nas garantias fundamentais como a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, o livre exercício dos cultos religiosos, a não privação de direitos por motivos de crença religiosa ou de convicção filosófica.
Poderíamos inverter esse argumento e utiliza-lo justamente para defender a retirada dos símbolos religiosos. O que justifica que apenas crucifixos sejam expostos? Se o estado é laico, o que justifica a manutenção dos mesmos? Não seria justamente a laicidade, defendida pela própria AGU, melhor expressa se tais símbolos deixassem de estar afixados nos prédios e órgão públicos, garantindo um real e efetivo pluralismo simbólico?
A AGU, cuja competência está prevista em lei específica, é o mais elevado órgão de assessoramento jurídico do Poder Executivo e exerce a representação judicial da União perante o Supremo Tribunal Federal. Submetido à direta, pessoal e imediata supervisão do Presidente da República. 
A AGU agiu de forma "técnica" para sustentar a sua tese. Na ação, os advogados afirmaram que a Constituição protege a liberdade de religião para facilitar que as pessoas possam viver a sua fé, o artigo 215 impõe ao Estado a proteção das manifestações das culturas populares, indígenas, afrodescendentes e das de outros grupos participantes do "processo civilizatório nacional".  
A "defesa técnica" adotada pela AGU, é muito melhor compreendida dentro da covardia peculiar dos aparatos burocráticos brasileiro. Dentro dos limites impostos pelo regramento jurídico do estado brasileiro, imputar uma responsabilidade direta a Presidenta Dilma pela ação da AGU beiraria a leviandade. Podemos sim cobrar a falta de um posicionamento mais claro com relação a este tema por parte da presidenta, do PT e demais partidos aliados, e que coloque a importância da defesa do caráter laico do estado brasileiro em sua devida urgência. 
Temas como este, dos símbolos religiosos em órgãos públicos, não é uma "questão menor" que não deva ser objeto de polêmica e debates, pelo contrário, ela expõe muito do caráter contraditório e frágil do estado brasileiro.
A AGU neste episódio deu sua decisiva contribuição para que o caráter laico do estado brasileiro seja ainda uma luta a ser conquistada, para além do exercício meramente retórico, cobrando ações efetivas.
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Um comentário:

Apelido disponível: Sala Fério disse...

Usando um argumento parecido, os anarquistas poderiam propor a retirada da efígie da República das notas e de todos os documentos públicos ...

A questão da tradição cultural de um povo não deve ser abstraída ou excluída. Selos contêm imagens (até de Zumbi) e citações, notas são objetos de troca: por que não poderiam contê-las?

Deus não é um ente de uma única religião! O argumento do MPF é furado ao dizer que o uso dessa palavra privilegia uma única religião. Toda religião tem um ou mais deuses - e um deles costuma ser tido como a divindade central.

E a citação positivista na bandeira? Também deveria ser removida porque o positivismo está superado?