É apenas mais uma Silva? A falência de uma polícia militarizada


Por Erick da Silva

Cláudia Silva Ferreira saiu pela manhã de casa para comprar pão. Mãe de quarto filhos e
responsável pelos cuidados de outros quatros sobrinhos, pretendia apenas fazer a rotineira tarefa de alimentar sua família. Moradora do morro da Congonha, em Madureira no Rio de Janeiro, jamais poderia imaginar que sua vida seria ceifada de uma maneira brutal naquele dia.

Durante seu trajeto, Cláudia foi surpreendida por uma troca de tiros entre três policiais do PM com supostos criminosos na favela. No incidente, acabou sendo ferida à bala no pescoço e nas costas. A história, no entanto, não se encerraria aqui. Cláudia não iria integrar a extensa lista das pessoas vitimas de balas perdidas. A tragédia ainda iria se estender de uma maneira ainda mais cruel.

Os três PMs envolvidos no tiroteio pegaram a mulher e a jogaram no porta-malas –e não no banco traseiro– de uma viatura. A intenção, segundo eles, seria a de socorrê-la, pois o relatório da polícia afirma que a vítima ainda estava viva. No entanto, como diria o dito popular, "o inferno está cheio de boas intenções". A intenção de salva-la converteu-se em um bárbaro assassinato.

Baleada e jogada no porta-mala da viatura, ela teria seu corpo arrastado durante 250 metros. O crime cometido pelos PMs foi captado por um motorista que gravou parte do percurso de Cláudia até o Hospital Carlos Chagas. A gravação, publicada pelo site do jornal Extra, mostra o porta-malas da viatura aberto e o corpo de Cláudia pendurado pelas roupas, enquanto era arrastado ao ritmo da ultrapassagem apressada do veículo policial.

A responsabilidade do estado pela morte de Cláudia é inquestionável. Thaís Silva, filha da vítima e a primeira a encontrá-la morta, sintetiza seus sentimentos e a revolta: "Eles arrastaram minha mãe como se fosse um saco e a jogaram para dentro do camburão como um animal".

Certamente virão aqueles que dirão se tratar de apenas uma fatalidade, mas essa premissa é equivocada. A aparente fatalidade de um tiro se converteu em um crime praticado por agentes do estado que devem ser responsabilizados. O cruel e dramático desta situação é não se tratar de um caso isolado que choca a todos nós. É uma situação extrema que demonstra um quadro maior onde a Polícia Militar se caracteriza pelos abusos e excessos de violência, principalmente contra negros e pobres. Os dados são inquestionáveis a este respeito.

A morte de Cláudia é mais uma prova de que esse atual modelo de segurança pública está falido. Quantas Cláudias e Amarildos serão necessários para que se rompa esse ciclo perverso de arbitrariedades e violência? Até quando permaneceremos com uma polícia militarizada, herança dos tempos ditatoriais? Alternativas existem, posterga-las apenas agravará uma situação inaceitável.
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